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Três histórias russas - resenha

Hello pessoas, como vão?

Há alguns dias eu vim até aqui para anunciar e propor um desafio rápido de leitura. Inspirada por um vídeo da Tati Feltrin, eu resolvi fazer três leituras russas: "O Chefe da Estação" do Puchkin, "O Capote" do Gógol e o "Gente Pobre" do Dostoiévski. E agora, feitas essas leituras, venho até aqui pra falar um pouco mais delas.


Obras de Dostoiévski, Púchkin e de Gógol
Antes de mais nada, porém, preciso comentar uma coisa. No vídeo da Tati, ela fala sobre a leitura de Gente Pobre e explica que as outras duas histórias são muito citadas no livro e que as três possuem uma forte relação, principalmente por causa de seu realismo. E eu, bom... concordo com a Tati. Logo mais todos vão entender o motivo. 

Antes vou falar rapidamente sobre cada uma dessas histórias.


1) "O Chefe da Estação" do Púchkin

É um conto com cerca de 20 páginas que pode ser encontrado no livro " A Dama de Espadas" de Aleksandr Púchkin. Ele vai nos falar sobre um homem que trabalha como chefe de estação - que não é uma estação de trem, mas de troicas, umas carruagens/trenós movidos a cavalo que existiam na Russia nos séculos XVIII e XIX. Esse homem é um funcionário do governo, mas um funcionário de nível muito baixo. Seu salário é miserável e seu trabalho quase incessante. Mas apesar de tudo, ele é feliz porque tem uma linda e jovem filha que faz de seus dias os melhores, não importe as dificuldades que enfrentem.

Quem nos conta essa história é outro servidor do governo que num determinado dia parou naquela estação para pegar uma troica. Entre uma conversa e outra ele acaba conhecendo o chefe e a filha e fica sabendo de suas histórias. Logo em seguida, ele parte. Segue sua vida.

Passados alguns anos, porém, ele acaba voltando à mesma estação e qual a sua surpresa ao encontrar o mesmo chefe de estação já velho e abatido e com ar muito triste. Eles voltam a conversar e o rico servidor do governo acaba descobrindo que a filha, a riqueza daquele velho, foi levada por um homem que ali passou um dia e que já há muito tempo ele não tem notícias dela.

O rico homem segue mais uma vez sua vida, mas algum tempo depois não consegue evitar e volta à vila da estação. Ele descobre então qual foi o destino de ambos os personagens. Pai e filha. E o leitor fica tomado de pesar. É uma história triste do início ao fim.

2) "O Capote" do Gógol

É outra história de miséria sem fim, mas com um toque de humor, ou pelo menos, alguns alívios cômicos. Ela pode ser encontrada no volume "O Capote e outras novelas" de Gógol e tem cerca de 30 páginas. Nelas somos apresentados à vida de Akáki Akákievitch. Ele também é um funcionário público de categoria baixa. Trabalha como um espécie de copista de documentos e no momento em que a história se passa, sua situação é a mais deplorável possível.

Isso porque apesar de ser um ótimo funcionário e de exercer muito bem a profissão que lhe cabe, seu salário não é alto e não cobre nem mesmo as despesas mais básicas. Mais um inverno se aproxima e seu capote - uma espécie de capa/casaquinho que se usa por cima dos ombros - está muito velho, gasto, rasgado e já cheio de costuras. Ele não pode continuar usando aquilo, porque ele não será bem visto em seu trabalho, e também porque a peça já não esquenta a ninguém em tal estado.

Ele resolve então procurar um alfaiate para tentar um conserto da peça, mas esse lhe dá uma má notícia. Não há como recuperar o capote. É preciso comprar outro. Akáki procura alguma alternativa, mas percebendo que não há jeito, decide se privar ainda mais de muitas coisas para juntar algum dinheiro e comprar o tal capote novo.

Passado algum tempo, depois de muitas dificuldades acompanhadas pelo leitor, Akáki finalmente consegue o dinheiro para a peça. Nesse dia, reparando na nova vestimenta, seus colegas o convidam para uma pequena festa na casa de um deles. Akáki não tem muito interesse em ir, mas o convencem e ele vai. No retorno para casa porém, algo terrível lhe acontece. Adivinhem... sim, ele é assaltado e roubam-lhe o capote.

Isso, porém, não é nenhum spoiler porque após esse acontecimento é que a história fica interessante. Akáki passa então por situações muito difíceis. Tanto pelo frio quanto pela tentativa de recuperar o casaco. Ele peregrina nos gabinetes das autoridades pedindo ajuda e só escuta coisas rudes. Por fim, doente pelo frio que passa, ele cai de cama. O que acontece então, deixo que o leitor descubra.

Desde já preciso dizer que a história tem ares fantásticos e me surpreendeu muito no final. De todas as três foi a que mais gostei de ler.

3) "Gente Pobre" do Dostoiévski

E por fim, o Gente Pobre de Dostoiévski é um pequeno romance, com cerca de 140 páginas na edição portuguesa de 2006 da Editorial Presença. Ele conta a história de Varvara e Makar. Ela é uma jovem com seus vinte e poucos anos e ele é um senhor já de mais idade. Através de suas conversas descobrimos que eles sentem algo um pelo outro - nem que seja um grande carinho -, que têm algum parentesco distante, que moram não muito distantes um do outro - porque ele enxerga a janela dela - e trocam cartas. Muitas cartas. E é por meio dessas cartas que acompanhamos a história porque esse é o que chamamos de um romance epistolar. 

Nessa correspondência trocada, eles falam principalmente de suas rotinas, de seus medos e de suas dificuldades. Já de início podemos perceber que ambos são pobres - como diz também o título do livro - e que passam por muitas dificuldades. Ele trabalha como funcionário do governo - é também uma espécie de copista - e ela faz alguns serviços de costura. Ambos moram em prédios compartilhados por muitas pessoas - uma espécie de cortiço - se alimentam mal, se vestem mal, dormem mal e vivem mal. Mas eles têm um ao outro. São muito bons amigos. 

Percebemos também que eles procuram se ajudar. Sempre que possível um envia ao outro um pequeno mimo, uma moedinha, algo de comer diferente ou mesmo livros. Isso porque apesar de muito pobres ambos são leitores ávidos e compartilham essas leituras e depois conversam sobre elas. Entre as obras lidas estão o conto O Chefe da Estação e a novela O Capote. 

Aos trancos e barrancos a história de ambos segue. Até que algo acontece na vida de Varvara que muda completamente a vida de ambos. Não vou contar aqui porque perderia a graça, mas vou dizer que num primeiro momento ambos ficam felizes com o acontecido. Eles não demoram a perceber o erro, porém. E então não podem mais voltar atrás, de forma que o romance termina de forma quase que trágica. 

É interessante saber das vidas dos personagens, e acho que esse era um dos principais objetivos de Dosiévski ao escrevê-lo - mostrar a realidade da comunidade russa de seu período. Aliás, é muito interessante a representação social que Dostoiévski faz dos russos daquela época, porque nos permite ver alguns aspectos bem bacanas. A presença da literatura, por exemplo, é um desses aspectos. O livro mostra que havia cultura e o hábito de ler mesmo entre os mais pobres. E mostra que eles eram leitores críticos

Outro aspecto interessante, é que esse foi o primeiro livro de Dostoiévski e, apesar de ter apenas 25 anos quando o escreveu, ele conseguiu fazê-lo muito bem. A ideia de uma história contada através de cartas também é sempre muito interessante. São os personagens falando por eles mesmos. 

Percebe-se de fato uma busca por estilo próprio, como a Tati também comentou no vídeo dela. Dostoiévski mostra isso até mesmo pela fala de seu personagem que muitas vezes diz estar buscando um estilo próprio em suas cartas.

REFLEXÃO

Bom, se você leu até aqui, então acho que eu nem preciso falar muito sobre as tantas semelhanças que as três histórias têm. Como a Tati apontou, elas possuem mesmo muitos elementos comuns. A pobreza, a miséria, as gentes pobres, com suas dificuldades materiais e financeiras estão em todas as três histórias. 

Além disso, há semelhanças nas profissões dos personagens, na forma e local de trabalho, no estilo de moradia, e até mesmo na cidade onde vivem. Há também uma perda de pessoas queridas para o dinheiro, uma sina de felicidade que vem acompanhada de desgraça. 

Mas acho que a principal reflexão que podemos fazer sobre essas três leituras, muito além da influência que um autor teve na vida do outro, ou da inspiração que Dostoiévski pode ter buscado para construir seus próprios personagens, deve estar ligada à questão social, muito destacada no texto. 


Fiódor Dostoiévski - Créditos: Divulgação

É duro saber de vidas assim. É um choque de realidade. E é ainda mais triste pensar que ainda hoje há famílias e pessoas que vivem de tal forma. E nem precisamos ir até a Rússia. Nas nossas cidades deve ter alguém assim. É duro e difícil se colocar no lugar delas. Mas é preciso para que se possa compreender as decisões tomadas pelos personagens.

Tati explica no livro dela que com o Gente Pobre, Dostoiévski inaugurou o gênero Romance Social na Rússia, um estilo que tinha como objetivo justamente o retrato social. As outras duas histórias, porém, também possuem a sua parcela de realismo, mesma que escritas de formas diferentes - uma mais cômica e outra mais dramática - e em comum, todas ela têm o fato de fazerem refletir sobra a vida que essas pessoas levavam. 

Então se você, assim como eu, não tinha tido contato com, ou tinaha tido muito pouco, dê uma chance a essas leituras. Acho que você não vai se arrepender. 

Beleza? 
Então é isso por hoje.  
Beijos.

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